sábado, 3 de abril de 2010

Chamados ou voluntários


Todos nós, que estamos no serviço da Igreja (não importando qual seja o movimento) somos os “chamados” por Deus (Jo 15,16). Portanto, o que vamos abordar não se trata, necessariamente do chamado para o trabalho, mas do chamado para o ministério. Se estamos no ministério certo, ou se ainda não encontramos o nosso espaço, ou seja, o ministério que Deus tem para nós (e não o que nós queremos), é ponto para reflexão. Na maioria das vezes, estamos tão preocupados com o “fazer algo para o Reino”, que esquecemos de saber o que fazer, e corremos o risco de fazer algo que não era necessariamente prioritário ou, até mesmo, necessário.

O primeiro chamado nosso é para amar e deixar-nos amar por Deus. Deus, primeiramente, quer trabalhar em nossas vidas e não necessariamente que nós trabalhemos para Ele. Temos invertido muito a ordem natural dos fatos, o que provoca muita insegurança quanto ao ministério, pois, na pressa de realizar algo, acabamos agindo com muita emoção. Portanto, o que vamos analisar é: se estamos ou não no trabalho que Deus quer para nós.

Se analisarmos a vida de Saul e de Moisés, vamos encontrar pontos divergentes que nos auxiliará na construção do perfil de uma pessoa realizada em seu ministério (Moisés - “chamado”), e de uma outra pessoa que não se encontrou dentro do “Plano de Deus” (Saul – “voluntário”) – o que não implica que Saul, como “voluntário”, não tivesse sido escolhido por Deus, mas sim, que não soube discernir qual a missão de Deus para ele.   

Observação: em grupos

SAUL

-          Como Saul chegou a Rei?  1Sm 8,5: “Dá-nos um rei que nos governe...

-          Qual foi a motivação do povo para pedir um rei?  1Sm 8,7: “Não é a ti que eles rejeitam, mas a mim, pois já não querem que eu reine sobre eles”. A motivação do povo é: primeiro, ter um rei como todos os povos; segundo, não querer aceitar a realeza de Deus sobre eles. Portanto, Saul vai ser rei baseado nas motivações humanas: o povo queria um rei.

MOISÉS

-          Como chegou a libertação do povo? Ex 3,7: “O Senhor disse: Eu vi, eu vi a aflição de meu povo que está no Egito, e ouvi os seus clamores por causa de seus opressores”.
-          Qual foi a motivação? O sofrimento do povo.
-          Qual foi a ação de Deus? Ex 3,10: “Vai, eu te envio ao Faraó para tirar do Egito os israelitas, meu povo”. A diferença básica entre Moisés e Saul está no agente gerador e realizador da ação: no 1º caso o agente gerador é o povo e sua insatisfação e o agente realizador é o próprio povo; no 2º o agente gerador é o sofrimento do Povo, e o agente realizador é Deus, que olha com misericórdia para o seu povo. Portanto, começamos a delinear o perfil do “chamado e do voluntário”.
1º Ponto:
O voluntário nasce de uma ação própria ou do povo, o “chamado” nasce da vontade de Deus. É preciso analisar qual foi a motivação que me levou a assumir o meu trabalho (ministério) atual – motivação própria, interesses pessoais, interesses de outros ou vontade de Deus?
2º Ponto:
Saul: 1Sm 13,9: “Trazei-me o holocausto e os sacrifícios pacíficos. E o ofereceu o holocausto”. Saul não tem visão dos limites de sua missão; não soube diferenciar entre seu ministério (função) e o de Samuel; e começa a entrar na função de Samuel. A função sacerdotal não era sua, e sim de Samuel. Saul demonstrou que não tinha visão definida do Plano de Deus.
Moisés: Ex 3,16 – A missão  - Ex 4,15 – Ministério de Aarão - Ex 29,4 – Sacerdote de Aarão
Moisés tinha consciência de sua missão e sabia que cabia a ele, apenas, conduzir o povo e com ele haveria Sacerdotes e Profetas. Mas a função dele era levar o povo à Terra Prometida.  
Conclusão:
A pessoa chamada por Deus tem que ter visão da missão, da sua função dentro do Plano de Deus. A pessoa voluntária (por não conhecer a missão e não ter visão do Plano de Deus), não encontra sua função no seio da Igreja e, quase sempre, está se metendo na função dos outros. Você conhece a missão que Deus tem para você? Qual a sua função especial na Igreja?
3º Ponto:  
Saul: 1Sm 14,24,33: Aqui vamos encontrar a imprudência de Saul, que coloca fardos pesados sobre os ombros do povo, impedindo-o de comer na véspera de uma importante batalha e jogando-o para o pecado, pois, devido à fome eles comem carne com sangue, que era um pecado contra Deus. Quase provoca a morte do filho.
Moisés: Ex 14,13-16: “Tende ânimo, e vereis a libertação que o Senhor vai operar...” Moisés não coloca fardo no povo, ao contrário sabe animar e estimular o povo; não exige sacrifícios, quando o povo tem fome, providencia comida. 
Conclusão: O “voluntário” acredita que a opressão e a escravidão contribuem para que Deus possa operar, ou seja, pensa que desta forma está ajudando a Deus. A pessoa “chamada”, ao contrário, sabe que a vitória é de Deus; tem consciência que a força é do alto e que ela é apenas instrumento.
4º Ponto:
Saul:
1Sm 15,3: “Vai, pois fere Amelec e volta ao interdito tudo o que lhe pertence, sem nada poupar...”
1Sm 15,9,11: “Mas Saul e seus homens pouparam Agag, assim como o melhor do rebanho médio e do grande...”
Deus dá uma ordem para Saul, ele desobedece e quer enganar a Deus; não tem pureza de intenções; quis levar vantagem guardando para si o melhor rebanho.
Moisés:
Nm 14,15; Ex 32,10: “... Vou destruí-lo, ferindo-o de peste, mas de ti farei uma nação mais poderosa do que ele”.
Nm 16,28: “Moisés disse, então: Nisto conhecereis que o Senhor me enviou a fazer todas estas obras, e que nada faço por mim mesmo”.
Moisés, ao contrário, era obediente, fazia aquilo que Deus ordenava, e não queria levar vantagem, tanto que não aceitou a proposta de elevar seu nome às custas da destruição do povo, ou seja, Moisés tem pureza de intenção.
Conclusão:
A pessoa voluntária não sabe perceber a ordem do Senhor, portanto, não cumpre, não obedece e faz todas as coisas para levar vantagem. O “chamado” sabe que o Senhor é quem o guia, portanto, é dócil às ordens dele e não busca seus próprios interesses, e sim a Glória de Deus.
5º Ponto:
Saul:
1Sm 15,21: “O povo somente tomou dos despojos algumas ovelhas e bois, à guisa de primícias do interdito, para sacrificar ao Senhor”.
Saul tente justificar seu erro, criando uma situação que justificasse a sua desobediência; não assume seu erro; não tem humildade suficiente para reconhecer seu erro; sente que é mais fácil justificar do que assumir.
Moisés:
Dt 34,4: “...Mas não entrará nela”.
Moisés teve que pagar pela infidelidade do povo, e pagou um alto preço. Após andar 40 anos e tantos sofrimentos, o mínimo que ele poderia esperar era entrar na Terra Prometida. Mas Moisés não justifica, não tenta defender-se diante de Deus. 
Ex 18,24: “Moisés ouviu o conselho de seu sogro e fez tudo o que tinha dito”.
Moisés também tinha humildade suficiente para ser aconselhado por outros. A humildade que faltou em reconhecer diante de Samuel sua culpa, Moisés teve para reconhecer que era passível de erro.
Conclusão:
O “voluntário” está sempre justificando seus erros, nunca assume sua incapacidade, suas limitações; precisa mostrar que é uma pessoa infalível.
O pior é que isso cansa; faz com que a pessoa desgaste-se e esteja sempre reclamando do peso de ter que carregar os outros. O “voluntário” não tem humildade para aceitar as idéias dos outros; não aceita ser corrigido e nem aconselhado. O “chamado”, ao contrário, sabe que Deus usa-o com suas limitações, e que o importante não é a pessoa, mas a Graça de Deus. A pessoa é apenas instrumento e necessita, muitas vezes, de ajuda inclusive dos próprios irmãos: é necessário humildade para receber críticas e conselhos. 
6º Ponto:
Saul:
1Sm 16,14: “O Espírito do Senhor retirou-se de Saul e um espírito mau veio sobre ele...”
Saul perdeu a Graça de Deus. Sua rebeldia, sua falta de humildade e outras falhas fizeram com que Deus retirasse dele Sua Graça. Conseqüentemente, Saul passou a ser dirigido, conduzido pela carne, pela própria vontade; passou a fazer tudo sem a unção de Deus. O Espírito de Deus abandonou Saul, e ele chega a uma situação máxima: a Graça de Deus já não está com ele.
Moisés:
Nm 9-15-23: “...Quando se levantava a nuvem de fogo sobre a tenda, os israelitas punham-se em marcha, no lugar onde a nuvem parava, aí acampavam... e observavam a ordem do Senhor”.
Ex 33,14: “O Senhor respondeu: Minha face irá contigo, e serei o teu guia...”
Moisés, ao contrário, era conduzido por Deus. O Espírito de Deus animava, guiava e conduzia-o, fazendo com que ele tivesse segurança na caminhada. Moisés sabia que, sem Deus, não dava para continuar.
Nm 11,14: “Eu sozinho não posso suportar todo esse povo”.
Deus tinha que estar com ele; não dava para caminhar sem a Graça de Deus.
Conclusão:
O “voluntário” está sempre agindo sem a graça de Deus e, portanto, fazendo a sua própria vontade. O “chamado” procura sempre fazer a vontade Deus.
7º Ponto:
Saul:
1Sm 18,6-9: “Dão dez mil a Davi, disse ele, e a mim apenas mil! Só lhe falta a coroa! E, a partir daquele dia, Saul olhou Davi com maus olhos”.
Saul passa a ter ciúme de Davi, e isto faz com que e inicie uma perseguição de sua parte a Deus.
Moisés:
Nm 27,14: “Moisés disse ao Senhor: O Senhor Deus dos Espíritos de tosa a carne escolha um homem que chefie a assembléia...”
Moisés sente-se gratificado ao ver que o escolhido de Deus é Josué, um discípulo seu. Ele sabe que a obra continuava, e que ele desaparecerá. Mas, o importante é que continue a obra. Ele não se sente como dono da obra, mas apenas como um instrumento que pode ser substituído.
Conclusão:
O “voluntário” pensa que ele é insubstituível, e quando surge alguém com capacidade superior, logo sente ciúme, inveja e o desejo de abafar aquele que está surgindo. O “chamado”, ao contrário, sente-se feliz ao olhar e ver que foi capaz de formar alguém igual ou superior a ele próprio, pois o importante é a continuação da obra.
8º Ponto:
Saul:
1Sm 22,16-19: “O Rei disse: Tu morrerás. Aquimelec, tu e toda a tua família”.
Aquimelec, sacerdote, tinha ajudado a Davi, e isto foi suficiente para despertar a ira de Saul, que mandou matá-los. Saul não admitia que alguém contraísse suas ordens; que alguém questionasse sua autoridade. Quando sentia que estava ameaçado, apelava para a morte, ou seja, destruía o irmão.
Moisés:
Nm 12-1-13: “...Porventura, é só por Moisés,diziam eles, que o Senhor fala? Não fala ele também para nós?...”
Nesta passagem, vamos ver que Aarão e Maria começam a questionar a autoridade de Moisés, e que ele ainda pede a Deus para não feri-los, mesmo Deus tendo tomado partido a favor de Moisés.
Moisés poderia, desta forma, aproveitar-se da ira de Deus e deixa-lo castigar seus irmãos. No entanto, Moisés não pensou assim; não interessava para ele destruir o irmão, mas sim fazê-lo crescer.
Conclusão:
O “voluntário” não suporta ver suas ordens serem contrariadas, sua autoridade ser questionada, não suporta ver ninguém que não aceite suas ordens: não suporta os irmãos que o questionam, que não concordam com ele – sempre que pode, procura prejudicá-los. O “chamado”, ao contrário, procura a reconciliação, a paz e a harmonia com os irmãos; ele sabe que o julgamento cabe a Deus e não a ele.

Temos aqui, portanto, algumas considerações para questionarmos a respeito de nosso ministério. Estamos respondendo o chamado que Deus fez para nós? Sem dúvida, Moisés compreendeu o chamado de Deus, e soube entender que a obra e o povo não lhe pertenciam, e sim a Deus; que ele era passageiro; que era necessário dividir o trabalho com outros; que era preciso formar outros para não correr o risco de ver o trabalho parado. É preciso entender que, o louro da conquista não importa, o importante é que Deus seja louvado.

È preciso ter clara a nossa posição dentro do Plano de Deus, e ao mesmo tempo, compreender que não podemos caminhar sozinhos; precisamos do irmão; que não podemos encará-lo como concorrente, mas sim como irmão, porque temos o mesmo objetivo: “a Glória de Deus”. 

Reflita: Como é que você sentiu-se chamado(a)?
Os apóstolos e discípulos ao serem chamados, sentiram alegria do encontro com o Senhor, e tornaram-se seus seguidores, sendo testemunhas, anunciadores do Reino de Deus (Cf Jo 1,35-476). A samaritana quando se encontra com Jesus (Jo 4,4-30) se converte, muda de vida e vai anunciar à comunidade a chegada do Messias.

Caso você tenha se sentido como um “voluntário”, não se desespere! Basta você ter humildade, reconhecer seu erro, e Deus virá ao seu auxílio. Creio que em todos nós, em algum momento em nossas vidas, somos “voluntários”, mas isso não significa que não sejamos “chamados” de Deus. Tudo é apenas uma questão de localizarmo-nos dentro do Plano de Deus.

Amém

 “Levantai os olhos e contemplai; os campos já estão dourados para ceifar”. (Jo 4,35)

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